O que sou nĂ£o deve
ser regra de convivĂªncia. O que sou morre comigo.
Descobri que amar nĂ£o
Ă© fazer com que o outro siga meu ritmo insano.
Isso Ă© ditadura.
Amar nĂ£o Ă© puxar a
namorada para o nosso fĂ´lego, nĂ£o Ă© arrancĂ¡-la de seu temperamento e forçar
semelhanças.
Isso é indiferença.
Amar nĂ£o Ă© punir
atrasos e castigar descompassos.
Isso Ă© tortura.
Amar nĂ£o Ă© ameaçar
com frases egoĂstas como “A fila anda”. É o contrĂ¡rio: Ă© perder o lugar na
fila, Ă© ceder seu lugar na fila, Ă© regressar ao inĂcio da fila.
Amar Ă© estranhamente
recuar. É encurtar as pernas para melhor passear, alongar os braços para melhor
entrelaçar os dedos.
O apaixonado nĂ£o
impõe seu temperamento, acostuma-se a caminhar diferente, olhando ao lado. O
lado passa a ser a nossa frente. Quem nos ladeia Ă© o nosso horizonte.
SurgirĂ¡ um
contratempo de sua companhia, uma dificuldade inesperada e se verĂ¡ contrariando
seus planos para ajudar – sĂ³ tem pressa quem nĂ£o tem urgĂªncia.
Amar Ă© proteger mais
do que avançar, é cuidar mais do que atingir objetivos, é apoiar mais do que se
vangloriar da distĂ¢ncia.
Foi a minha avĂ³
Mafalda que me explicou. Ficava muito irritado pelo seu trotear na Rua Corte
Real. Era velhinha, manca e, alĂ©m de tudo, distraĂda. Ela me obrigava a participar de sua
andança fisioterĂ¡pica depois do almoço. Um quarteirĂ£o correspondia a queimar
calorias de quatro quilĂ´metros.
– Meu neto, Ă© bom acompanhar um familiar doente, pois amar Ă©
ir aos poucos, Ă© lentidĂ£o por fora e interesse por dentro – ela dizia.
NĂ£o fazia lĂ³gica para
mim. Amar parecia voar, correr, atropelar. Amar significava velocidade,
superaĂ§Ă£o, afoiteza. Amar traduzia liberdade, transgressĂ£o, nĂ£o se intimidar
com os limites.
Eu me enganei, vĂ³.
Seu andar miĂºdo,
pequeno, de bengala, pesando cada pĂ© no chĂ£o, me ofereceu uma aula emocional.
Nenhum casal corre de
mĂ£os dadas.
Amar Ă© aguardar se
necessĂ¡rio, voltar atrĂ¡s se preciso, criar um novo passo para atender os dois.
Se fui apressado para
conquistar minha mulher, agora devo ser lento, estar com ela Ă© meu destino.
Publicado no jornal
Zero Hora
Coluna semanal, p. 2,
02/04/2013
Porto Alegre (RS),
EdiĂ§Ă£o N° 17390
Amei o texto...muito lindo!!!
ResponderExcluir"Amar Ă© proteger mais do que avançar, Ă© cuidar mais do que atingir objetivos, Ă© apoiar mais do que se vangloriar da distĂ¢ncia."
Muito lindo.
ResponderExcluirE quem diz que os avĂ³s nĂ£o sĂ£o sĂ¡bios Ă© um ignorante, por sorte tem quem enxergue a verdade e outros preferem continuar cegos.
Um texto lindo, puro e simples. *-*
ResponderExcluirGeralmente os mais velhos dĂ£o sĂ¡bios conselhos.
Que lindo texto!
ResponderExcluirEstou levando para o meu blog