Apesar de ficção, do Barro ao Santo faz entrelace com fatos reais. Apropria-se da linguagem popular, buscando focar o viver dos personagens ambientados no pós-guerra da Independência da Bahia, focando a vida de um ex-combatente com toda o traumático existir quando no seu retorno à normalidade da sua vida: vaqueiro, membro da Irmandade do Rosário dos Pretos e Pardos de Inhambupe (Bahia) que engajado no agrupamento de Encourados de Pedrão, no período dos combates, volta para sua terra vitimado por estresse pós-traumático e luta para adaptar-se às suas normalidades de vida.
No materializar do intertextual, o intento do autor, é estilizar a linguagem popular, tal como se valem os cordelistas na literatura nordestina, buscando ritmo e celeridade na escrita – um escrever mais dinâmico –, ao tempo que leveza e identidade, aproximando-se das falas dessa região baiana.
Inspira-se em Glauber Rocha, Deus e o Diabo na Terra do Sol, e Dias Gomes, nas obras O Pagador de Promessas e Saramandaia, atentando a esses autores e obras, quanto à rítmica, o fantástico, o místico e o mítico.
José Antônio Quinto, ou
Zezão, é o nosso herói vestido em couros. Lutou com sangue nos olhos para
sobreviver na guerra da Independência da Bahia, pois se você não matar, acaba
morrendo. Sua bravura foi reconhecida por todos que o circulam, e a volta para Inhambupe,
sua terra natal, prometeria uma vida que ele não imaginaria.
Após salvar Esmeraldina das mãos
de um coronel odiado por todos, Zezão construirá sua vida ao lado de uma linda
mulher que é corajosa como ele. O coronel, prometendo vingança, precisará ter
muita coragem para enfrentar Zezão, que tem o apoio da Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário, liderada pelo seu irmão Anacleto.
Porém, a sombra do seu passado
cruel da guerra ainda lhe persegue, confundindo seu juízo. Será que é difícil
viver em paz? A vida nos anos 1800 não é fácil, principalmente para aqueles
corajosos a viver no semiárido nordestino, e construir uma família requer força
de vontade e o apoio dos mais próximos, mas, quem é humilde, Deus sempre há de
ajudar.
É muito legal lermos uma ficção
histórica tão presente que ainda influencia nossos dias atuais. Muitos dos cenários
descritos no romance ainda existem, e é incrível como o autor consegue nos
situar na época e no espaço.
Um ponto que eu achei fantástico
foi trazer todo o regionalismo nordestino para a obra. Desde a narrativa até os
diálogos. Repleto de dialetos, conseguimos ficar mais próximos dos personagens
e das situações encontradas durante a história. Foi a escolha perfeita para
sairmos do padrão das histórias “corretamente escritas”. Gostei de ver que
muitos dos dialetos presentes ainda são usados, e alguns que adorei conhecer,
como “o di cumê”, que interpretamos como qualquer refeição do dia.
Diante desse fato, alguns
leitores podem ter uma pequena dificuldade em entender algumas expressões. O
autor se preocupou em colocar um glossário no final do livro, e outras palavras
podem ser facilmente encontradas na internet.
Os personagens são todos bem
construídos, desde os principais aos secundários. Um que eu gostei bastante foi
Fogoió, o rapaz de cabelos de fogo, que lutou ao lado de Zezão e viveu uma
grande aventura em Inhambupe. Seu espírito de bravura é muito intenso e ele não
aceita injustiças. Até eu queria ter um amigo como Fogoió, o rei das rodas de
conversa.
Os momentos finais da história
são repletos de aflições! À medida que eu lia, eu esperava pelo pior (não
contarei spoilers) e somos levados a acreditar que milagres realmente existem.
A sorte sempre esteve ao lado de Zezão, e com certeza não iria deixar de
socorrê-lo mais uma vez.
Do barro ao santo é um livro
ideal para enriquecer seu conhecimento sobre a cultura nordestina. Essa
aventura, entre o recôncavo e agreste baiano, promete muitas surpresas e
emoções, e tem que ter muito “sangue nos zóio” para aguentar todo o clima!
O livro é uma publicação da
Editora Appris – selo Artêra – de Curitiba, Paraná.
Para entrar em contato com o
autor, para mais informações, seu email é hbacelar360@gmail.com e seu facebook
é facebook.com/Helio.Bacelar.Viana
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